segunda-feira, 16 de junho de 2008

Coronel Curió saiu do armário? (parte 4)

Luiz Carlos Antero

"Imaginação e realidade"

"Vi os papéis nas mãos do Curió" — sustentaria o presidente da Cooperativa, Ataliba da Silva Leite, principal signatário do documento. Curió é definido no texto do JB como "personagem símbolo da repressão no Araguaia e o principal arquivo vivo de todos os mistérios que rondam a história da guerrilha e do minério". Rival de Ataliba, o presidente do Singasp (Sindicato dos Garimpeiros de Serra Pelada), Raimundo Benigno Moreira, "põe um pouco mais de tempero na versão": "A área onde está o garimpo era dos guerrilheiros. Quem conhece a história e mora na região sabe disso. Quando toco no assunto, as autoridades do Ministério de Minas e Energia dizem que são coisas da ditadura, do passado e desviam do assunto".

"Imaginação fértil ou realidade, o fato é que essa suspeita nunca chegou a ser investigada a fundo", comenta a matéria do JB, que acrescenta: "O circuito da guerrilha compreendia uma extensão estimada entre 7 e 9 mil quilômetros quadrados, e englobava pedaços do Sul e Sudeste do Pará e uma parte do hoje Estado do Tocantins".

De um modo ou de outro, todos esses elementos ofereceriam maior consistência política e substância ideológica à resistência que seria gradualmente construída na região, jogando por terra as interpretações levianas acerca do planejamento existente. No desespero, a saída "estratégica" do coronel Curió termina por ensarilhar uma afiada faca de dois gumes contra seu próprio peito e da corporação militar.

Inúmeros crimes pós-guerrilha

Na prática, essa conversa tem um outro prumo. A story line de Curió sugere que, não fosse seu desempenho no combate a esse projeto (ou, de modo mais factual, nos assassinatos cometidos para roubar direitos de concessão à lavra), ele poderia ser algemado, preso e submetido a um julgamento público por crimes que se sucederam à Guerrilha do Araguaia, e inoculam uma capenga "lei de anistia".

Entre esses crimes, está até mesmo a execução, em 1993, de um adolescente de 17 anos (hoje contaria 35 anos) que supostamente teria penetrado em sua chácara, em Brasília. No final de 2007, as Câmaras Criminais Reunidas do TJE decidiram adiar o seu julgamento pela acusação do homicídio doloso daquele jovem brasileiro, em denúncia formulada pelo Ministério Público do Distrito Federal, pois Curió "não foi localizado", apesar de ter endereço e local de trabalho conhecido, na prefeitura de Curionópolis.

Pois, como parte de sua tarefa, ele ganhou uma cidade, de onde foi prefeito (e permaneceu ainda em 2008, resistindo à cassação que culminou um processo por abuso do poder econômico formulado pelo TSE). E persistiu semeando execuções. Depois de comandar as operações de extermínio no Araguaia, construiu um feudo econômico e político, exercendo até hoje forte influência na região conflagrada.

Curió fundou Curionópolis (PA), que se emancipou de Marabá em 1988, exercendo o primeiro mandato de prefeito após uma longa folha de serviços prestados ao regime numa região onde fez muitas vítimas entre os garimpeiros, mantendo-se indiferente a quaisquer sinais de mudança.

Exemplo disso foi o assassinato de Antônio Clênio Cunha Lemos, então presidente do Singasp, em Curionópolis, na madrugada do dia 17 de novembro de 2002, com cinco tiros, dois dos quais na cabeça.

Dois anos antes, o mencionado Raimundo Benigno Moreira, que o sucederia no comando do Singasp, fora vítima de esfaqueamento em Serra Pelada. (continua)

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