segunda-feira, 23 de abril de 2007

Redivisão territorial do Pará divide opinião de deputados

A Assembléia Legislativa do Pará (Alepa) debateu na manhã desta segunda-feira (23) a redivisão territorial do estado, numa sessão especial requerida pelo deputado Arnaldo Jordy (PPS).
A sessão teve a participação do vice-governador Odair Correia, dos deputados federais Giovanni Queiroz (PDT), Zenaldo Coutinho (PSDB), Asdrúbal Bentes (PMDB), Zequinha Marinho (PMDB) e Zé Geraldo (PT), e de 21 deputados estaduais, além do secretário executivo da Associação dos Municípios da Calha Norte, do Movimento (Amucan), Antônio de Figueiredo Neto, do coordenador do Movimento pelo Plebiscito de Criação do Estado do Tapajós, Edwaldo Bernardo, e do presidente da Sociedade de Preservação dos Recursos Naturais da Amazônia (Sopren), Camilo Viana, e de dezenas de lideranças políticas das regiões oeste e sul do Pará.
O vice-governador, que já presidiu um movimento pelo Estado do Tapajós, defendeu a nova postura do governo do Estado de regionalizar a administração para atender toda a população, mas criticou o fato de 480 mil paraenses do oeste do Pará terem migrado para o Amazonas em busca de melhores condições de vida.
Divisão de opinião
Para o deputado Arnaldo Jordy, sem uma reordenação do pacto federativo que assegure um diferencial capaz de promover a superação de desigualdades entre as regiões, dividir seria fragmentar o subdesenvolvimento.
Segundo o parlamentar, é preciso superar desigualdades como as que se vê nos investimentos do BNDS que, de R$ 52,3 bilhões investidos no país, em 2006, destinou 60% dos recursos para o sudeste (R$ 31,414 bilhões) contra apenas R$ 1,318 bilhão destinado ao Norte. Ele criticou a visão maniqueísta com que o assunto é tratado e alertou: “Podemos estar mordendo a isca do processo de exclusão e marginalização do Pará”.
Os deputados das regiões sul e oeste do Pará declararam abertamente o seu voto na criação dos novos estados do Tapajós e de Carajás, a exemplo de Alexandre Von (PSDB), Josefina Carmo (PMDB), Júnior Ferrari (PTB) e Carlos Martins (PT).
Os deputados Parcifal Pontes (PMDB), João Salame (PPS) e outros se posicionaram pela criação do estado de Carajás. O assunto também divide os deputados federais. Zenaldo Coutinho defendeu a integridade do estado, opinião da qual não comungam Zequinha Marinho, Asdrúbal Bentes e Giovanni Queiroz, que defenderam a criação do estado de Carajás.
Dividida quanto à criação dos novos estados, a maioria dos deputados, entretanto, defende o direito da população de ser consultada sobre o assunto.
Carlos Bordalo (PT) disse que vai apresentar requerimento à Mesa para que a Assembléia Legislativa se manifeste a favor do plebiscito que foi defendido pela maioria dos presentes.
João Salame criticou o fato de o estado ter investido centenas de milhões de reais em obras como o Mangal das Garças, Estação das Docas e o Centro de Convenções, todas em Belém, enquanto em Marabá e Santarém, cidades cotadas para capital dos possíveis estados de Carajás e do Tapajós, não houve investimento algum nessa área.

3 comentários:

BAR E RESTAURANTE SOARESeLIMA disse...

O fato não é ser a favor ou contra, mas termos dados concretos (friso: sem índices tendenciosos) de que esta divisão faz-se necessária. Particularmente sou contra. Motivo: aumentarão as despesas públicas que aliás, são grande vilão do PIB. Penso que, na contramão, deveriam começar a haverem "fusões estaduais".

EDMILSON SANCHES disse...

Waldyr, tomo a liberdade de lhe enviar recente texto sobre o assunto "redivisão territorial". Espero que alimente o debate cortês e propositivo. (Edmilson Sanches)

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O MARANHÃO DO SUL NA “VEJA”

EDMILSON SANCHES

Quando o assunto é redivisão territorial do Brasil, as pessoas que são contra sacam logo do bolso dois únicos argumentos: 1) vai aumentar a roubalheira, a corrupção; e 2) o País não tem dinheiro para pagar a sua parte da conta (construção, instalações, equipamentos e manutenção de órgãos governamentais e remuneração de servidores).


Sou defensor da redivisão, mas não é isso o que me leva a concluir o quanto esses argumentos são frágeis, ou, no mínimo, apressados. Em relação à corrupção e roubalheira em novos estados, vale lembrar que elas têm a idade do ser humano -- que sempre quer mais, mesmo quando se encontra no Paraíso. Se o volume de roubalheira e corrupção, calculado em reais ou em dólares, fosse vinculado à redução das endodivisões (redivisão dos Estados), São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília sequer existiriam, ou tornariam ao estado de natureza. Neste país se rouba do povo desde sua descoberta -- basta citar os quase R$ 700 bilhões em corrupção e desperdício levantados em reportagens do jornal “O Dia” (RJ) em 2002.


Quanto à inexistência de recursos para implantação dos novos estados, diga-se que grande parte do dinheiro que a União investiria (é isso mesmo: investimento, não gasto) retornaria aos cofres do Tesouro Nacional. São altos os impostos incidentes sobre os materiais de construção (perto de 40% no cimento, na tinta e no vaso sanitário e 37% no tijolo). E mais impostos sobre os móveis, as instalações e até o material de expediente e, em especial, sobre a folha de pagamento dos funcionários. Em uma casa popular de R$ 45 mil os impostos “comem” R$ 22.275,00. Some-se a isso o custo do consumo, os tributos embutidos nos preços dos bens, produtos e serviços pagos com a massa salarial e outros ganhos -- impostos que vão de 18% na carne e no feijão, 40,5% no açúcar, a até 56% na cerveja e 83% no litro de cachaça.


Portanto, vale repetir, se o Governo Federal investir R$ 1,9 bilhão em cada novo estado, ele teria esse valor de volta logo logo, e com “juros”, pois a nova dinâmica econômica que se desenvolveria na nova unidade federativa aumentaria o bolo dos impostos para os cofres públicos, sem falar nos ganhos indiretos, que viriam com a redução de gastos em assistência social, saúde, bolsas-issos e vales-aquilo, já que grande parte da população ficaria ao abrigo de atividades produtivas (assalariados, autônomos, empresários e empreendedores, além de parte no Serviço Público).


Economistas, sociólogos e outros pesquisadores e estudiosos têm um campo desafiador nesse assunto: o quanto retorna, para a União, do dinheiro investido na instalação de um novo Estado. O economista Roberto Limeira (raro caso de razão e paixão na pesquisa e estudos sobre o tema) mostra por A + B, ou melhor, com todos os números: menos de dois e meio por cento (R$ 12 bilhões) do meio trilhão de reais do Programa de Aceleração do Crescimento (o PAC, do Governo Federal), aplicados na criação de seis estados (Araguaia, Carajás, Gurguéia, Maranhão do Sul, São Francisco e Tapajós), gerariam nessa área (incluindo-se o estado do Tocantins) um milhão de empregos e riqueza (PIB) de R$ 60 bilhões (atualmente, já são gerados R$ 40 bilhões). Somente com os impostos e divisas de exportação, em apenas dois anos a União teria o retorno de todo o investimento feito, sem falar nos ganhos sociais, políticos, de auto-estima, de consolidação do território nacional e a repercussão econômica e social nos demais estados, sobretudo os do Sul-Sudeste, que venderiam mais para os novos “irmãos” e “desinchariam” parte de sua população, com a volta de muitos brasileiros para suas origens nortistas e nordestinas.


Geopoliticamente, dividir não é fragmentar, mas consolidar. Se a sede de dinheiro e poder, se os sem-moral e os sem-vergonha da política se aproveitam do sonho da redivisão territorial para cometer seus crimes, onde está a culpa: no sonho ou no vagabundo político que sordidamente se assenhoreia dele? Ora!... Contra a corrupção (e outros crimes) devem agir Justiça, Polícia, Ministério Público... e a cidadania vigilante. Se essas estruturas não são eficazes a ponto de prender esses políticos bandidos, reaver o dinheiro e conter a sangria desatada que vitima o povo, então é bom diagnosticar as razões da ineficácia, receitar o remédio e controlar sua administração (sem trocadilho).


Dividir mais para administrar melhor tem sido tendência e realidade no mundo inteiro. Só os que não se dedicam um pouco mais ao estudo, acompanhamento e análise podem se assentar em bases tão pouco sólidas quanto as alegações de falta de dinheiro e excesso de corrupção como fatores inibidores da redivisão territorial.


Nem o nosso planeta agüentou ser uma terra só. Saiu da condição de Pangéia, dividiu-se em dois supercontinentes e, no momento, são seis continentes. Até o começo do século 20 existiam pouco mais de 70 países. Agora, são quase duzentos. O que a Geologia começou, a Geografia confirmou: dividir faz bem -- e a Religião e a Filosofia ratificam. Divisão não é o mesmo que apropriação, corrupção. A redivisão territorial é a mais rápida e mais segura forma de promoção do desenvolvimento, de inclusão social. Com roubos e tudo.


A França, país quase do tamanho da Bahia, tem hoje 96 estados (départements), mais quatro além-mar e mais de 36 mil municípios (comunas). Quase 16 vezes maior do que o território francês, o Brasil existe com seus 26 estados e um distrito federal e menos de 5.700 municípios. Os Estados Unidos, com apenas 9% a mais de área que o Brasil, têm 51 unidades federativas e cerca de 30 mil cidades. A Alemanha, com 356 mil km2 (apenas 7% a mais que o Maranhão), tem 16 estados e mais de 12 mil cidades. A Espanha, com 505 mil km2 (bem menor que Minas Gerais), tem 50 estados (províncias) e oito mil cidades, total este semelhante ao da Itália, país com 301 mil km2, bem menor do que o Goiás.


Do “A” do Afeganistão ao “Z” do Zimbábue, a correlação entre área territorial e quantidade de estados (ou similares) encontra no Brasil o país de mais injusto desequilíbrio, especialmente quando a isso se juntam as desigualdades socioeconômicas.


A revista "Veja", que trouxe em 15/08/2007 um texto do paulista e paulistano Roberto Pompeu de Toledo (“O Maranhão do Sul na Wikipédia”), talvez não abrigue réplicas em igual espaço -- é a força da “ditadura” e do monólogo dos veículos de comunicação bem sucedidos, que impõem, quase sem reserva, o poder de sua mensagem para o resto do país e para leitores nos quatro cantos do mundo, ouvindo quase nada a população, mesmo quando o assunto tem importância vital sobre o presente e futuro dela.


O articulista Toledo talvez não saiba que a luta pela redivisão do lado sul do Maranhão tem mais de 180 anos. Que nossas riquezas naturais e culturais, a capacidade desbravadora e empreendedora de brasileiros de todo o país e de estrangeiros de todos os continentes fizeram progredir esta região e ainda vão transformá-la em referência de desenvolvimento. É o “estado de espírito” enriquecido com o “espírito de estado”.


Além de estarem incorretas as referências do artigo do sr. Toledo, elas pecam ao afirmar que o Estado do Maranhão do Sul, quando criado, “irá para a rabeira [sic]”. Não irá. Como também não foram o Tocantins e o Mato Grosso do Sul. Pois saiba que a parte sul do Maranhão tem riquezas naturais, geografia estratégica e outras vantagens comparativas e competitivas. O que falta -- e disso o Brasil é cheio -- é decisão política para promover o desenvolvimento regional com envolvimento do capital humano intelectual e social aqui formado ou que para aqui se transferiu.


Falar de pólos agrograneleiros e agroenergéticos, recursos minerais e florestais, pecuária e indústria, comércio e agricultura, infra-estruturas etc. é necessário, mas, aqui, seria cansativo. Talvez em outra oportunidade.


Quem é contra a redivisão talvez deseje que o Brasil volte a ser um conjunto de capitanias. Talvez a paulista e paulistana “Veja” e o paulista e paulistano Toledo não se opusessem ao retorno de São Paulo ao território do Rio de Janeiro, a cujo governo “ficou sujeito, tanto administrativamente como no Judiciário”, como anotou Ildefonso Escobar. Ou, alternativamente, São Paulo reintegre-se ao território da Bahia, de cujo governo “ficou dependente” também. Talvez os paranaenses não se importem se seu estado voltar a pertencer a São Paulo. Talvez os paulistas não se incomodem (afinal, tudo é Brasil) de devolver ou buscar consideráveis glebas dos territórios de Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso. Talvez a capital Curitiba e o estado de Santa Catarina voltem correndo para se reincorporar ao estado paulista. Talvez o Rio de Janeiro queira de volta a São Paulo que por algumas vezes lhe tiraram, em um puxa-encolhe que, como sanfona, resfolegou, veio e voltou do século 16 ao século 18.


O Maranhão do Sul será uma realidade -- não por força de “jogadas” de enfraquecimento político que nunca existiram. O Maranhão do Sul, mais dias menos dias, virá -- não por birra inútil ou vontade fútil. Não. Ele acontecerá como parte do debate nacional e da tendência e prática internacional de dividir mais (o território) para dividir melhor (seus recursos entre os cidadãos). Nestes momentos -- e também nos demais --, a corrupção não deve ser entendida como regra, mas como anomalia. Ela é um desvio do caráter humano, não uma característica da gestão da coisa pública, da Ciência Administrativa.


Em sonho, em lutas, em riquezas materiais, em potencialidades de toda ordem, o Maranhão do Sul é grande. É maior do que a ignorância daqueles que, por falta de interesse ou oportunidade, ainda não sabem do que estão falando.

Ou escrevendo.

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EDMILSON SANCHES, jornalista e consultor, tem pós-graduação nas áreas de Administração, Comunicação e Desenvolvimento, com diversos livros publicados. Contatos: edmilsonsanches@uol.com.br ou esanches@jupiter.com.br

EDMILSON SANCHES disse...

Maranhão do Sul e Redivisão Territorial:
A Idade das Trevas ainda não Acabou

EDMILSON SANCHES

Foi reenviada a mim uma mensagem assinada por um pretenso sr. “Carlos”. O texto originalmente estava em um “site” que reproduziu meu artigo “O Maranhão do Sul na ‘Veja’”, em resposta ao artigo “O Maranhão do Sul na Wikipédia”, publicada na revista paulista, edição de 15 de agosto.
Não costumo responder a mensagens da espécie, ofensivas, sem identificação etc. e tal. Mas o gestor do “site” deu mais visibilidade ao texto semianônimo e disse estar esperando uma resposta. Em atenção a ele e, quem sabe, a outros leitores expectantes, é que me reporto à mensagem e, aqui e ali, ao seu autor. Contando com a sensibilidade deste “blog”, peço a publicação deste artigo, onde faço algumas considerações sobre o “ataque” daquele adversário da redivisão territorial.
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O sr. Carlos de Tal sabe que existe a ignorância que é falta de conhecimento e a ignorância que é falta de educação. Seu texto apresenta sintomas das duas.
Em cinco parágrafos não há um em que o autor não tente desqualificar grosseiramente o que escrevi -- embora o sr. Carlos ele mesmo não se qualifique, amoitando-se no matagal de recursos da Internet para identificar-se apenas com um suposto prenome.
Quem não tem medo de debates sérios e civilizados, expõe-se e identifica-se. A práxis dos destemperos verbais é, infelizmente, comuníssima na rede mundial de computadores, com destaque para comentaristas incivis e respondentes anônimos de “blogs”. A regra é não dar atenção a eles, não para sustar o debate, mas porque se torna uma “luta” desigual, senão injusta: o que defende fica à mostra; o que ataca (sic) se oculta. O sr. Carlos de Tal “apela” para qualificativos e nominativos do tipo “estupidez”, “ignorância”, “vômito”, o pejorativo “estadeco” (designação depreciativa para cada um dos sonhados novos estados brasileiros).
Quão onisciente é a formação do sr. Carlos, quão irrefutáveis seus argumentos, quão rematada sua lógica, quão viável é o lugar onde mora, quão ética sua postura e quão feliz e perfeita tem sido sua vida a ponto de não se revelar a seres e inteligências menores e – “magister dixit!” – presumir-se infalível e definitivo no que escreve?
Infelizmente para o sr. Carlos de Tal, coragem movida a ocultação e tese movida a destemperos não são nem tampouco serão suficientes nem para brecar uma discussão sadia nem, muito menos, para invalidar o direito e dever de recolocar a geopolítica brasileira como um dos itens prioritários da agenda nacional.
Passo às “quase falácias” que foram apontadas no texto “O Maranhão do Sul na ‘Veja’”.

I - DEPARTAMENTOS SÃO ESTADOS?

O sr. Carlos de Tal exclama que as comparações sobre países que fiz “tratam departamentos, províncias, regiões e estados como se fossem a mesma coisa!” Didático -- o que não o impede de estar enganado --, define que, “em geral, chamam-se estados as unidades federativas com significativa autonomia, em campos como o judicial, tributário, legislativo e outros”. Antegozando o nocaute verbo-conceitual, arremata: “Províncias e outros em geral nem são chamados de unidades federativas, uma vez que uma federação é composta de unidades com certa autonomia”.
Seu Carlos, seu Carlos... Ao utilizar os termos “departamentos” e “províncias” só preservei e respeitei os nomes com que alguns países designam suas divisões administrativas. O sr. Carlos engana-se ao achar que o termo “estado” seja exclusivo ou o mais utilizado para as unidades administrativas que detenham, no seu dizer, “significativa autonomia” ou “certa autonomia”. Desse modo erra ainda ao negar autonomia a divisões administrativas pelo simples fato de elas não se chamarem “estados”, como, para citar um exemplo “carlista”, as províncias.
Na extensa pesquisa que fiz em 2001, sobre 196 países, listei, por baixo, umas duas dezenas de termos para designar uma unidade federativa e/ou divisão administrativa. Parte dos dados desse trabalho foi publicada em texto divulgado em jornal, no dia 8 de maio daquele mesmo ano (pode ser lido em www.estadomaranhaodosul.blogspot.com.br). Mas no meu texto “O Maranhão do Sul na ‘Veja’” (um artigo, não um tratado) só citei dois casos --: os 100 departamentos franceses e as 50 províncias espanholas. E... será que, por serem chamadas em suas pátrias de “departamentos” e de “províncias” essas unidades territoriais não estão revestidas de “significativa” ou de “certa autonomia”? Vejamos as constituições da França e da Espanha:
FRANÇA – A República Francesa, com 60,7 milhões de habitantes, tem 100 departamentos em 543.965 km2, área 15 vezes menor do que a do Brasil, que tem 27 unidades federativas (26 estados e um distrito federal). Na Constituição Francesa, o Título XI estabelece que as “entidades territoriais” da França são as “comunas, departamentos e territórios ultramarinos” e que outras “entidades” poderão ser criadas pela legislação. Logo adiante, o Título XII, que trata de “A Comunidade”, Artigo 77 (intitulado nada mais nada menos que “Autonomia”), item 1, estabelece que as “entidades territoriais” “gozam” de “autonomia”, “conduzem sua própria administração” e “administram seus interesses” “democraticamente e livremente”. Não configuraria isso tudo uma “certa” e “significativa autonomia”?
ESPANHA – A Espanha, com 43,4 milhões de habitantes, tem 52 províncias em 505.954 km2, área 16 vezes menor do que a do Brasil. A Constituição Espanhola, em seu Artigo 137, dispõe, literalmente, que: “El Estado [o país, a Espanha] se organiza territorialmente en municipios, en provincias y en las Comunidades Autónomas que se constituyan”. E em seguida: “Todas estas entidades gozan de autonomía para la gestión de sus respectivos intereses”. Pelo que se lê nessa língua irmã, o que no Brasil se chamam estados, na Espanha são províncias, que têm, constitucionalmente, sua “autonomía”. Será que precisa traduzir? Mas para se convencer da autonomia das regiões internas da Espanha nem precisaria irmos até o Artigo 137 da Constituição desse país. Bastaria quedarmo-nos no Artigo 2, que estabelece de entrada que “La Constitución (...) reconoce y garantiza el derecho a la autonomía de las nacionalidades y regiones” que “integran” “la Nación española”.
Passemos a outros exemplos.
ARGENTINA - A Argentina, com 39,1 milhões de habitantes, tem ao todo 24 unidades administrativas em 2.780.092 km2, área três vezes menor do que a do Brasil. A Constituição da Argentina também dá o nome de “província” ao que no Brasil denominamos “estado”, mas nem por isso as províncias “hermanas” deixam de ter sua autonomia. Excetuado o fato de não poderem “exercer o poder delegado à Nación” (o que é óbvio), o Título Segundo, artigos 121 a 125, trata da autonomia das províncias e detalha seus poderes.
COLÔMBIA - A República da Colômbia, com 46,3 milhões de habitantes, tem 33 divisões administrativas (“departamentos”) em um território de 1.141.748 km2, quase 7 vezes e meia menor do que o Brasil. A Constituição Colombiana garante logo de cara, no Artigo 1º, a “autonomía de sus entidades territoriales, democrática, participativa y pluralista”. Mas, se esse primeiro artigo não fosse suficiente, a autonomia dos “departamentos” e outras “entidades territoriales” é reforçada nos artigos 286, 287 e, onze números depois, 298. (No artigo anterior, 297, diz como o Congresso Nacional pode decretar a formação de “nuevos departamentos”).
PERU - Assim também acontece no Peru (neste momento com parte de sua população enfrentando a tragédia de um terremoto). A República do Peru, com 28,4 milhões de habitantes, tem 25 departamentos em 1.285.215 km2, quase sete vezes menor do que o Brasil. A Constituição Peruana, Capítulo XIV, define que a república peruana “se divide en regiones, departamentos, provincias y distritos, en cuyas circunscripciones se ejerce el gobierno unitario de manera descentralizada y desconcentrada” (Artigo 189). Nos três artigos seguintes, tanto as províncias quanto as “regiones” e as “municipalidades” têm assegurada sua “autonomia”.
MÉXICO - Os Estados Unidos Mexicanos, com 108,3 milhões de habitantes, têm 32 unidades administrativas em 1.972.547 km2, área quatro vezes menor do que a do Brasil. Também no México, o largo “sombrero” constitucional abriga e protege os 31 “estados unidos mexicanos” e o distrito federal, considerados republicanos, “libres e soberanos” (artigos 40 e 115). De quebra, o Artigo 73 dispõe sobre a criação de novas unidades (uma das pré-condições é de o território ter pelo menos 120 mil habitantes).
Para não dizer que ficamos só no continente americano, nos últimos quatro exemplos acima, vamos à Rússia, cuja enorme extensão territorial, a maior do mundo, precisou de partes de dois continentes (Europa e Ásia) para abrigá-la.
RÚSSIA - A Federação Russa (o outro nome legal da Rússia, conforme destaca o Artigo 1º. Da Constituição do país), com 142,5 milhões de habitantes, tem 89 unidades administrativas (nominadas “sujeitos” na versão em inglês do texto constitucional russo): são entidades territoriais consideradas repúblicas, regiões, províncias, distritos e áreas autônomas, distribuídas em 17.075.400 km2, área duas vezes maior do que a do Brasil. Os quatro itens do artigo 5º da Constituição Russa tratam da “Estrutura Federal” e dizem da autonomia dos seus territórios e autodeterminação de seus povos. Os artigos 65, 66 e 67 também tratam do assunto, a ponto de, numa demonstração de equanimidade do “status” territorial, o Artigo 65 listar o nome de cada uma das unidades da Rússia (da república da Adygeya até a área autônoma Yamal-Nenets).
Como se conclui, não é o nome (departamento, província, estado) o que confere autonomia ou não a uma unidade federativa ou administrativa. O que estabelece isso é a Constituição do país.
II - CANADÁ E AUSTRÁLIA
O sr. Carlos de Tal, no usufruto de sua incivilidade, classifica como “ignorância” ou “falácia” a ausência de menção ao Canadá e à Austrália, países com área territorial semelhante à do Brasil, embora com menor número de unidades administrativas. No artigo “O Maranhão do Sul na ‘Veja’” escrevi: “Do ‘A’ do Afeganistão ao ‘Z’ do Zimbábue, a correlação entre área territorial e quantidade de estados (ou similares) encontra no Brasil o país de mais injusto desequilíbrio, especialmente quando a isso se juntam as desigualdades socioeconômicas”. Esse período se completava com o seguinte trecho, transposto de texto de 2001: “Aliás, pela pesquisa que fiz, salvo melhor juízo ou cálculo, apenas dois países (a Austrália e o Canadá), entre as 196 nações do mundo, têm média de tamanho territorial maior que a do Brasil, em termos de área do país dividida pelo número de Estados ou Unidades Federativas. A Austrália tem, em média, 853 mil quilômetros quadrados (km2) por Estado, e o Canadá, o país mais desenvolvido do mundo, tem 766 mil km2. A média brasileira é de mais de 300 mil km2. (...) São muitos os países que têm um número bem maior de Unidades Federativas que o do Brasil: Afeganistão, 31; Albânia, 36; Argélia, 48; Egito, 27 (o mesmo tanto do Brasil, só que com um território de 1 milhão de km2, mais de oito vezes menor que o território brasileiro); Espanha, 50 (e apenas 505 mil km2); Estados Unidos, 51; México, 32; Turquia, 67. Se se considerar a média Estado/área territorial, praticamente os quase 200 países do mundo têm, em média, melhor divisão que o Brasil.” (Repita-se: esse trecho é de texto de 2001, daí o Canadá estar à frente em termos de Índice de Desenvolvimento Humano, lugar hoje da Noruega -- atualmente, o Canadá é o sexto colocado em IDH. Na época, também, a fonte consultada registrava menor número de unidades administrativas da Espanha).
Como se vê, um lapso de digitação (Ctrl + V, colar) não é uma falta de conhecimento, ou, nos termos “carlistas”, uma “ignorância” ou “falácia”. O sr. Carlos de Tal teve estertores de montanha, roeu-se e deu à luz a minúsculo murídeo. Roeu tanto o sr. Carlos que acabou por reduzir a quantidade de províncias e territórios do Canadá (que são 13, e não 9) e da Austrália (que tem 11 estados e territórios, e não 7). Mas nem por isso eu me tacaria por aí a qualificar uma pessoa como “ignorante” ou “falaciosa”. Às vezes, o erro pode ser da fonte consultada, de uma interpretação dada, de uma transposição de dados não conferida etc. etc. etc. – como tantas vezes têm acontecido comigo e com outros seres felizes e falíveis.
Voltando ao assunto: Por saberem que a única verdade estável é a certeza de que tudo muda, e como sabem que dimensões territoriais tão incomuns são uma razão para vindouras aspirações redivisionistas, os legisladores constitucionais da Austrália fizeram constar na Carta Magna do país diversos dispositivos sobre formação de novos estados (artigos 121 a 124, Capítulo VI, que, bem a propósito, leva o nome de “New States”).
III - NÚMEROS GEOPOLÍTICOS

O sr. Carlos de Tal, emetófobo, lista elementos de uma fórmula para as endopartições territoriais. Ele diz: “O artigo ainda vomita [sic] os números de divisões geopolíticas nos países citados como se a mera aritmética unidades/área fosse o argumento supremo e suficiente; esqueçam-se as razões históricas, as particularidades físicas, as potencialidades econômicas, as características culturais e as questões étnicas que motivaram essas divisões (...)”. E acrescenta: “Não se dá nem mesmo ao trabalho (fácil e simplista, mas melhor do que nada) de considerar as aritméticas PIB/unidade ou mesmo população/unidade”.
Deus do céu! Os leitores -- e, possivelmente, o obducto sr. Carlos – já reclamam do tamanho deste texto, imagine escrever um tratado com os diversos aspectos e particularidades da geografia, história, economia, cultura, etnicidade e/ou o Produto Interno Bruto ou população dos diversos países comparados ao tamanho ou quantidade de suas unidades administrativas/federativas. O que o sr. Carlos deseja?! Se ele quer ver tudo isso em um texto, contrate um pesquisador para isso, ou faça-o ele mesmo. Se não tiver tempo ou conhecimento, eu poderia avaliar uma proposta sua, profissional, para escrever uma enciclopédia sobre o assunto redivisão territorial no Brasil, incluindo-se análises e dados sobre o processo de formação de outros países e com referências atuais e jurássicas, a partir das formações geológicas Rodínia, Panottia, Pangéia, Laurásia e Gondwana.
Já escrevi um pequeno texto (“Razões para um novo estado”), onde alinhavo considerações ligeiras sobre itens a serem observados na defesa da criação de uma nova unidade federativa: “Autodeterminação”, “Força social e política”, “História”, “Identidade sociocultural e territorial”, “Infra-estrutura”, “Limites”, “Ocupação e integração”, “Viabilidade econômica” etc. etc. Como se vê, são diversos os motivos, razões, considerações, justificativas, questões, enfoques para serem avaliados e, sobretudo em conjunto, comporem um quadro, um projeto, uma defesa para o sonho de criação de um novo estado.
É assim, sr. Carlos de Tal, e o sr. sabe disso: escolher estes e aqueles indicadores não é omitir deliberadamente ou desonestamente estoutros e aqueloutros. Mais: o que o sr. julga “fácil e simplista” eu caracterizo como difícil e complexo, com a experiência de quem já escreveu diversos livros técnicos e até uma Enciclopédia carregada de dados numéricos, séries históricas, cronologias, dicionários onomásticos etc. etc. Mas isso deve ser fichinha para o senhor. Talvez o sr. seja um gênio.
Passe longe de lâmpadas...
IV - “ESTADECOS”
Definitivamente, o sr. Carlos não parece estar pronto para um outro nível de debate. Veja-se o que de desconhecimento e arrogância consta no que ele escreveu: “Os cidadãos de estados viáveis (como eu) são contra esses projetos de estadecos [sic] porque sabem que vão acabar pagando a conta. O autor sente cheiro de preconceito; eu farejo interesses escusos”. (A redação não reproduziu o que o raciocínio do escrevente quis repassar -- ele terminou por dizer que “fareja” “interesses escusos” onde eu, nas palavras dele, sinto “cheiro de preconceito”. Então, embora eu não tenha enveredado por palavras ou dizeres preconceituosos, o mensageiro Carlos ainda assim estaria reforçando o que eu (não) disse. Ô, complicação!).
Existem pelo menos três dezenas de livros que eu recomendaria que o sr. Carlos lesse, para entender a questão das desigualdades regionais e da redivisão territorial. Como disse Nélson Rodrigues (citado por Ricardo Henriques, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada e Universidade Federal Fluminense, em seu livro “Desigualdade e Pobreza no Brasil”, 740 páginas, IPEA, 2000): “Subdesenvolvimento não se improvisa, é obra de séculos”. (Esta frase é também creditada a Roberto Campos, economista, e a Millôr Fernandes, escritor, ambos, como Nélson Rodrigues, excepcionais frasistas).
Poderia lhe mostrar, como em Jacques Ribemboim, mestre e doutor em Economia em Londres e no Brasil, dados e históricos sobre formação e concentração de capital no Sudeste brasileiro e a hegemonia desta região sobre as demais, beneficiada por políticas de exportação a preços competitivos e importações a preços protegidos; o direcionamento de políticas cambiais e antiinflacionárias para a região de maior produção industrial, financiado pelos consumidores de regiões menos desenvolvidas; as endomigrações, que transferiram/transferem renda a partir da cessão de sua força de trabalho inadequadamente remunerada; os custos do transporte (seguro e frete), os royalties, franquias, direitos autorais embutidos nos valores pagos por regiões mais carentes que deveriam também ser produtoras e produtivas e exportadoras; concentração de empresas estatais, de instituições publicas de ensino e pesquisa, de funcionalismo público; política de câmbio, tributária, de substituição de importações; dívida externa etc. Na revista “Veja”, edição 1726, Edward Nicolae Luttwak, cientista político dos Estados Unidos, reforçava o que já se sabia aqui: que o Nordeste pagava os subsídios à indústria brasileira.
Eu poderia (deveria) perguntar aqui por que o sr. Carlos não disse uma única palavra sobre outros pontos do artigo “O Maranhão do Sul na ‘Veja’”. Meu texto ia além, muito além dos quatro pontos escolhidos a lupa e microscópio pelo adversário das sadias causas separatistas. Por exemplo: as lutas quase bicentenárias por um novo estado ao sul do Maranhão, desde 1827 (eu tenho indícios de que podem ter começado dez anos antes, em 1817); o estado de progresso e as potencialidades de desenvolvimento da região; a capacidade de retorno sobre o “investimento” do Governo Federal na instalação da nova unidade da federação; as bases conceituais (filosófica, sociológica, espiritual, administrativa e, em especial, legal), que não acobertam teses de que redivisões territoriais não devam acontecer porque, embutida ou explícita, delas tomariam de conta políticos corruptos, burocratas desonestos, servidores improdutivos, todos a vadiarem de modo bem-remunerado e a gatunarem os cofres públicos. Se é o mal que alguns antevêem, então não lhes custa a eles que torçam para que pereça o mundo, entregue-se a alma ao Capiroto e, humilde e humilhadamente, prolatem a sentença: o Mal venceu o Bem.
Na linha de sugestões livreiras, poderiam, ainda, ser recomendadas obras sobre a histórica questão econômica, de como com impostos e outras transferências as regiões pobres devolvem para as regiões desenvolvidas mais do que receberam. Há publicações de organismos federais atestando isso, com fartos dados, cálculos, tabelas.
Mas talvez, em princípio, fosse mais recomendável sugerir ao sr. Carlos de Tal uma bibliografia sobre o que sejam solidariedade social, unidade nacional, autodeterminação dos povos, brasilidade. Chamar de “estadecos” os futuros possíveis novos estados não qualifica o debate, pelo xiitismo e neofobia previamente destilados.
Nós, que defendemos a redivisão territorial brasileira, não nos sentimos ofendidos. Não nos permitimos absorver o que não presta. Sabemos que temos defensáveis razões para essa luta. Temos provas na História, na movimentação dos povos, na fortaleza de espírito, de que a redivisão é tendência e realidade. No mundo inteiro.
São muitos e centenários os estudos, os projetos, os livros, no Brasil e em outros países, que mostram a quem tiver olhos de ver o acerto da necessidade de redesenho do mapa territorial aqui e em todo o planeta.
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Ao final, o sr. Carlos durma tranqüilo, que ele não pagará a conta da redivisão. Nós já nos pagamos isso e financiamos considerável parte dos estados mais desenvolvidos. Quem lhe toma o seu dinheiro, sr. Carlos, está mais perto de você. Ponha a mão no bolso e tento no juízo.
Aliás, o sr. Carlos assegura que o estado “dele” é um estado “viável”. O que se entende mesmo por “viabilidade” de um lugar? Para começar, viabilidade não é território. O Japão é viável? Israel é viável? A variável edáfica, pedológica, diria que não, mas a inteligência humana supera adversidades. E aí está o Japão com a segunda maior riqueza econômica do mundo e Israel exportando talento em tecnologia agrícola, entre outras.
Quantas toneladas de cacau colheu a Suíça para produzir tantos e tão excepcionais produtos à base de chocolate? Como anda a agricultura cafeeira da Alemanha, ela líder mundial na fabricação de máquinas e equipamentos de torrefação e moagem e um dos países de maior consumo da bebida? Sabe-se que esses países não são produtores de cacau e café, mas, com perdão da redundância, sabem produzir produtos a partir dessas “commodities”, nas quais põem ciência e saber, agregam valor, apõem “griffes” e revendem por elevados preços (não é sem razão que o termo “commodity” (mercadoria) significa, na origem, “vantajoso”).
Repita-se: viabilidade não está na terra, mas na mente, na (boa) vontade e na capacidade de trabalho dos seres humanos que a habitam.
O sonho da redivisão territorial e, em nosso caso, do Maranhão do Sul, é um sonho sem sono. Por isso, estamos alertas: a Idade das Trevas ainda não acabou, e de vez em quando se reinstala em mentes desavisadas.
Teremos novos e bons estados, e com eles se fará melhor o futuro do Brasil.
Bem-vindo ao futuro todos os que têm medo (ou raiva) dele!

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EDMILSON SANCHES, jornalista e consultor, é autor de livros nas áreas de Administração, Comunicação e Desenvolvimento. Para palestras, cursos e outros treinamentos: edmilsonsanches@uol.com.br ou esanches@jupiter.com.br.