A Justiça em Sergipe acaba de condenar o jornalista
José Cristian Góes a sete meses e 16 dias de detenção. O crime cometido por
ele: ter escrito uma crônica ficcional sobre o coronelismo.
Mesmo sendo um texto em primeira pessoa e sem citar
nome de ninguém, o desembargador e vice-presidente do Tribunal de Justiça,
Edson Ulisses, alegou que se sentiu pessoalmente ofendido pela expressão
“jagunço das leis” e pediu a prisão do jornalista por injúria.
Apesar de todo o processo ter sido presidido pela
juíza Brígida Declerc, do Juizado Especial Criminal em Aracaju, a sentença foi
assinada no último dia 4 de julho pelo juiz substituto Luiz Eduardo Araújo
Portela.
“Esta é uma decisão em primeira instância. Vamos
ingressar com os recursos. Em razão de ser uma sentença absurda, não
acreditamos que ela prospere, mas, se for o caso, vamos até o STF, em razão de a
decisão ferir gravemente a Constituição Federal, e quem sabe, podemos ir até ao
CNJ e às cortes internacionais de Direitos Humanos”, informou Antônio Rodrigo,
advogado de Cristian Góes.
Os sete meses e 16 dias de detenção foram
convertidos pelo juiz Eduardo Portela em prestação de serviço a alguma entidade
assistencial.
O desembargador Edson Ulisses, cunhado do governador
Marcelo Déda (PT), alegou que a crônica literária intitulada “Eu, o coronel em
mim”, escrita pelo jornalista Cristian Góes em maio de 2012 em seu blog, ataca
diretamente o governador de Sergipe e a ele, por consequência.
Por isso, ingressou com duas ações judiciais. Na
criminal, o desembargador pedia a prisão de quatro anos do jornalista. Na ação
cível, solicita que o juiz estabeleça um valor de indenização por danos morais
e já estipula os honorários dos seus advogados em R$ 25 mil.
Numa audiência, o desembargador afirma: “Todo mundo
sabe que ele escreveu contra o governador e contra mim. Não tem nomes e nem
precisa, mas todo mundo sabe que o texto ataca Déda e a mim”.
O advogado Antônio Rodrigo provou com farta
documentação que é completamente impossível na crônica literária assinada por
Cristian Góes encontrar a mínima prova da intenção de ofender a honra de
ninguém. “Esse ‘alguém’ não existe no texto. Não é uma questão de
interpretação. A figura do injuriado não existe”, disse o advogado.
Durante o processo, a juíza negou à defesa do
jornalista ouvir duas de suas testemunhas, sendo uma chave para esclarecer todo
processo: o governador Marcelo Déda. Também não foi permitida uma série de
perguntas do advogado ao desembargador Edson Ulisses e às suas testemunhas.
A crônica literária “Eu, o coronel em mim” é um
texto em estilo de confissão de um coronel imaginário dos tempos de escravidão
que se vê chocado com o momento democrático. Não há citação de nomes, locais,
datas, cargos públicos.
Em Sergipe, o irmão do governador Marcelo Déda, o
desembargador Cláudio Déda, é o presidente do Tribunal de Justiça e o cunhado
do governador, o desembargador Edson Ulisses, é o vice-presidente, sendo que
este último foi escolhido e nomeado pelo governador.
Atendendo ao pedido do desembargador Edson Ulisses,
o Ministério Público, ainda na primeira audiência de conciliação, denunciou
criminalmente o jornalista. Por coincidência, dias depois da denúncia, a
promotora de Justiça Allana Costa, que era substituta e trabalhava no interior
de Sergipe, foi premiada com a promoção para a capital, em cargo de
coordenadoria.
Em uma das audiências do caso, vários representantes
de movimentos sociais que lutam pela liberdade de expressão, e até familiares
do jornalista, foram impedidos de participar da audiência. A segurança da
Polícia Militar foi reforçada na sede do Tribunal de Justiça. Todos os lugares
da sala de audiência foram tomados desde cedo por funcionários com cargos
comissionados e terceirizados do Tribunal de Justiça. (Sindijor – Sindicato de Jornalistas do Estado de Sergipe)
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