terça-feira, 12 de maio de 2009

O avarento

CRÔNICAS DO PC

Existe uma cidadezinha chamada Pequizeiro, anteriormente pertencente ao Estado de Goiás, hoje Tocantins, daquelas que toda população é conhecida, parente ou compadre.

Há tempos atrás, moraram na localidade alguns estrangeiros, de nacionalidade judia. Dentre eles, o típico cidadão, característica do seu povo, bigodudo, usava barbicha, chapéu preto e calça folgada, o mais sagaz e famoso “mão de vaca” existente no lugar. Seu nome verdadeiro era Theodor Herzl, em homenagem ao criador do sionismo em l897.

Mais tarde ficou conhecido apenas por Benjamim, dado a dificuldade da pronuncia do seu nome. Emigrou para o Brasil em pleno auge da Segunda Grande Guerra, fugindo da perseguição nazista, o Terceiro Reich alemão, comandado por Adolfo Hitler, a todo custo querendo exterminar o povo de origem judia em campos de concentração.

Numa viagem de sacrifício, em 1943 chegou ao Brasil e escolheu residir em definitivo, no interior de Goiás, pondo-se a trabalhar incansavelmente até formar economia suficiente para instalar seu próprio negocio. Foi bem sucedido, e logo ficou conhecido como o mais sólido comerciante da cidade. E também, um grande avarento. Era esperto em fazer negócios, nunca deixava de lucrar em qualquer transação comercial que realizava, não dispensando um centavo sequer.

Benjamin era seguro ao extremo. Não abria a mão pra nada. Economizava desde a sola do sapato, andando de chinelo feito de solado de pneu, a um palito de fósforo, que repartia no meio para acender duas vezes. Dizem que respirava aos poucos, cuja finalidade seria poupar o ar dos pulmões. Não recebia visitas em casa, a fim de evitar prejuízos, a exemplo de oferecer uma xícara de café. Nunca se casou ou teve mulher dependente, afirmando que mal podia se sustentar.

Mesmo assim, um dia arranjou um “quebra-galho”, numa situação perigosa. Tratava-se de mulher casada, tanto ela como o marido, patrícios hierosolimitanos, nascidos em Jerusalém, duas décadas antes da fundação do estado Judeu em 1948.

Quando emigrou para o Brasil, para sobreviver, escondeu-se nos guetos de Varsóvia, capital da Polônia, fugindo da Gestapo (polícia de segurança do Reich nazista).

Senhora Levi era o nome da judia “quebra-galho”. Vivia concedendo seus favores, muito às escondidas, ao patrício Benjamim que, para não fugir às regras, foi um dos melhores amigos de seu marido Abraão. A situação requeria muita discrição, por se tratar de infidelidade conjugal, e Benjamim, sagaz, cuidadoso, jamais subia ao andar onde residia a mulher, sem antes verificar o perigo de ser notado, e sempre aproveitando a ausência demorada do marido, que vivia mascateando pelas redondezas, ou em preces na sinagoga existente em outra cidade próxima.

Para que tudo corresse bem, a própria senhora Levi convencionou um sinal: ela atiraria ao amante uma moeda, níquel de dois tostões, e que tinha muito guardado em cofrezinho de cerâmica. A queda da moeda no calçamento seria o sinal de que ele poderia subir.

Assim, sucedeu, uma vez, duas, três, quatro noites, não seguidas. Na quinta, noite escura, com ameaças de cair um toró (o tempo estava bastante nublado), porém, a senhora Levi muito necessitada, atirou a moeda, e debalde esperou Benjamim aparecer. Aguardou bastante, tempo de o homem dar de si, mais de trinta minutos e nada. Ansiosa, ardente, a judia chegou à janela e falou sussurrando: “Benjamin! Tu estás aí?”

Uma voz da sombra respondeu: “Estou, sim!”

“Por que não sobes? Não ouviste o tilintar da moeda de dois tostões cair?”

“Ouvi, sim”,
confirma o homem, falando bem baixinho.

De rastro pelo chão, passando às mãos de um lado a outro, disse um pouco mais alto: “Mas ainda não achei a moeda. Estou procurando-a...”

A mulher apenas murmurou rangendo os dentes: “Judeu miserável, de uma figa!”

Pedro Cláudio M.Reis (PC) / E-mail: pcmourareis@yahoo.com.br

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