sábado, 28 de setembro de 2013

Mandante da morte de Dorothy Stang já cumpriu pena em regime fechado exigida por lei

Julgado pela quarta vez e condenado a 30 anos de prisão pela 2ª Vara do Tribunal de Júri de Belém por ter sido o mandante do assassinato da missionária Dorothy Stang, ocorrida em fevereiro de 2005 em Anapu (PA), o fazendeiro Vitalmiro Bastos de Moura, o Bida, já não tem mais pena a cumprir. Preso desde abril de 2005, ele já usufrui o benefício do regime semiaberto – só dorme na prisão – por ter cumprido um sexto da pena. Na prática, ele ficou cinco anos preso.
Além disso, os advogados poderão recorrer mais uma vez da sentença e pedir a realização de um quinto julgamento. Nos quatro julgamentos a que foi submetido até agora, o fazendeiro foi condenado três vezes e absolvido uma única vez.
“Fica uma sensação de que a lei não pune. Ao mesmo tempo em que a condenação de 30 anos passa uma imagem que se fez justiça, pela lei ele só precisa cumprir um sexto desta pena. Ou seja, cinco anos de prisão e já passou para o regime semiaberto. Num crime tão grave como este, os acusados ficaram pouco tempo atrás das grades e estão todos soltos”, afirma José Batista, advogado da Comissão Pastoral da terra (CPT).
Batista afirmou que o fato de Bida ter sido submetido a quatro tribunais do júri é uma demonstração de ineficiência da Justiça brasileira, do desempenho ruim do Judiciário na punição.
“Mesmo que tenha sido julgado quatro vezes, ainda poderá tentar um quinto julgamento. É um absurdo. Não conheço caso igual”, afirma José Batista.
Segundo o promotor do caso, Edson Cardoso de Souza, não dá para dizer que houve impunidade, pois ele cumpriu o tempo de pena exigido pela Lei de Execuções Penais. Ele explica que na hipótese de Bida ser absolvido num quinto julgamento e ele for considerado definitivo, haveria ainda a possibilidade de o fazendeiro exigir indenização do estado pelo tempo em que ficou preso.
O advogado da CPT afirma que de 800 mortes ocorridas no campo, em quatro décadas, apenas 4% foram julgadas. Para ele, a violência no campo só diminuiu porque não há pressão dos movimentos sociais para a criação de assentamentos de reforma agrária, mas conflitos seguem ocorrendo.
“Antes tínhamos de 10 a 15 ocupações de terra por ano. Agora, uma ou duas. A pressão agora está sobre comunidades ribeirinhas, agricultores que vivem do extrativismo e indígenas, pois os madeireiros seguem avançando sobre áreas que estavam protegidas e os criadores de gado querem aumentar a produção ocupando mais terras. Temos ainda grandes obras, como projetos de mineração, hidrelétricas, hidrovias e ferrovias que atraem para o Pará milhares de migrantes pobres e sem qualificação”, explica o advogado.
Marjorie Marona, pesquisadora do Observatório da Justiça Brasileira (OJB) e do Centro de Estudos Sociais para a América Latina, afirmou que a legislação penal e processual brasileira precisa se adequar a um novo contexto, para que fique em consonância com o anseio da população e da opinião pública.
“Não se trata de ampliar penas indiscriminadamente ou abrir mão de garantias fundamentais de defesa, mas de levar em conta que o Judiciário não consegue mais atuar devido a entraves processuais, e isso afeta negativamente a sociedade”, diz Marjorie Marona.
A pesquisadora afirma que é preciso repensar a democratização da Justiça, mas essa mudança depende também de reformas a serem aprovadas no âmbito do Legislativo.
“No campo penal fica muito evidente essa necessidade. Isso contribui para um cenário de impunidade”, afirma. (Cleide Carvalho)

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