Matéria
produzida pelo jornalista Ulisses Pompeu para o Jornal Correio, de Marabá,
sobre suposto esquema de superfaturamento de notas e desvio de recursos
públicos
A Câmara Municipal mais rica da região sudeste do
Pará é também a que mais gasta o dinheiro público de forma questionável. Esse
questionamento começou a ecoar entre moradores de Parauapebas, a 160 km de
Marabá, onde os 15 vereadores vêm sendo incomodados durante o mês de julho com
um movimento popular que entregou uma carta-denúncia ao Ministério Público
denunciando um suposto esquema de superfaturamento de notas e desvio de
recursos públicos.
A reportagem mergulhou nas contas da Câmara de Parauapebas
e encontrou, de fato, muitos pontos intrigantes e que merecem explicações por
parte dos gestores da CMP. O grande dilema para uma apuração mais acurada
esbarra no fato de que os pagamentos efetuados não constam no Portal da
Transparência a partir de outubro de 2013. Por isso, apenas os primeiros nove
meses de gestão podem ser analisados. Além disso, extratos de licitações
publicados no Diário Oficial do Estado em 2013 e 2014 mostram como os
vereadores multiplicaram por cinco aditivos de licitações. Os motivos? Ninguém
sabe (ainda).
O calcanhar de Aquiles de Câmaras pequenas e de
porte médio tem sido os gastos com diárias. Mas, como as contas estão
escondidas longe do Portal da Transparência do Legislativo, não há como
mensurar se os vereadores estão recebendo muita ou pouca diária em Parauapebas.
O campeão, entre janeiro e setembro de 2013, é o presidente Josineto Feitosa.
Ele recebeu 30 diárias no valor total de R$ 14.840 no período. Depois, aparecem
Devanir Martins, com R$ 12.000,00 e 21 diárias; Israel Pereira Barros, o
Miquinha, com R$ 11.800,00 (21 diárias), seguido de perto por Odilon Rocha, com
R$ 10.600,00 (18 diárias).
É preciso esclarecer que a diária de um vereador
custa R$ 600,00 para cidades mais distantes e R$ 400,00 se vier a Marabá, por exemplo.
Por isso, há uma variação entre a quantidade de cada um e os valores
correspondentes. Mas, numa Câmara que recebe mais de R$ 3 milhões por mês, é
preciso criar despesas inimagináveis para justificar tantos gastos.
Além de pagar diárias, o Legislativo de Parauapebas
ainda ostenta o luxo de pagar passagens aéreas e despesas com locomoção para
seus nobres vereadores e servidores. Como não há transparência o suficiente até
agora – os dados colocados pela CMP no portal na internet dizem respeito apenas
aos primeiros nove meses de 2013, e não há nada de 2014 – só podemos acessar os
gastos desse período, que chegam a R$ 97.579,02.
Duas empresas fornecem o serviço de passagens para a
Câmara de Parauapebas: J.L.P.Santos & Cia Ltda e P.B.Ribeiro e Cia Ltda,
que foram contratadas através de um pregão.
Algumas descrições informam corretamente quais foram
os beneficiários das passagens, mas há outras um tanto nebulosas, como o
pagamento de maior valor: R$ 19.598,23, que descreve apenas o seguinte, com
erro de grafia: “Histórico: Serviços de reservas e fornecimento de passagens
aérias para atender as necessidades do poder legislativo”. Em outra, usa os
nomes dos beneficiários: “passagem aeria de Francisco Solano, Josineto
Oliveira, Vicente Silva, Devanir Martins, Bruno Soares, Luiz Sergio Pinheiro”.
A reportagem enviou um questionamento na manhã de
segunda-feira (4), com 14 perguntas sobre os gastos da Câmara de Parauapebas,
para sua Assessoria de Imprensa, através do site www.parauapebas.leg.br. O que
recebemos até o fechamento desta edição foi um email com o seguinte teor:
“Devido um problema que tivemos em nosso servidor, somente no período da tarde
recebemos seu e-mail e não tivemos tempo hábil para responder a todos os
questionamentos”.
“Estamos coletando as informações para poder-lhes
passar, mas infelizmente, hoje não será possível, pois são muitas as
informações solicitadas e que necessitam de dados de diferentes setores. As
informações solicitadas serão úteis em outra data ou somente se fossem
repassadas hoje?”.
Em respeito ao direito de resposta, a redação do
jornal vai continuar aguardando as informações e manifestações da Câmara de
Parauapebas e pretende publicá-las na próxima edição.
Consultorias
levam R$ 774 mil da CMP em nove meses
Entre as empresas que se dão bem prestando serviços
para a Câmara Municipal de Parauapebas estão a Mel Consultoria e Assessoria SS
Ltda e Souza e Seixas Advogados Associados. A primeira prestaria serviços de
contabilidade e a segunda seria responsável por assessoria jurídica. Ocorre que
o Legislativo de Parauapebas tem sua própria assessoria jurídica e outra
contábil, o que, em tese, não careceria contratar serviços externos nestas duas
áreas.
Pelo que descreve o site da CMP, a primeira presta
assessoria e consultoria contábil, orçamentária, financeira, patrimonial e
operacional para cumprimento dos princípios fundamentais de contabilidade do
Poder Legislativo. Já a segunda empresa presta assessoria e consultoria
jurídica em direito administrativo, financeiro, procedimentos licitatórios e
contratos administrativos, elaboração e análise de lei, pareceres jurídicos e
defesa dos interesses da Câmara Municipal de Parauapebas junto à justiça comum
e Tribunal de Contas dos Municípios do Estado do Pará.
Entre janeiro e setembro do ano passado, a Câmara de
Parauapebas desembolsou a bagatela de R$ 774.050,00 para pagar esses dois
escritórios particulares. Sobre essa questão, indagamos a Assessoria de
Imprensa da Câmara a motivação dos gastos, haja vista que possui profissionais
destas duas áreas em seu quadro de funcionários, os quais já recebem salário
para realizar qualquer tipo de serviço e emitir pareceres.
Servidores
ficarão obesos com tanta comida comprada
Quanto comem os servidores “gulosos” da Câmara
Municipal de Parauapebas e onde a Mesa Diretora estoca tantos “gêneros
alimentícios” comprados pela atual gestão? Nos primeiros nove meses de 2013,
foram mais de R$ 280 mil em notas pagas para algumas empresas daquele
município.
As notas pagas começaram com valores pequenos no
início de 2013, como R$ 281,00, mas foram aumentando paulatinamente, até chegar
a cifras preocupantes, como R$ 7.945,00, próximo ao limite de R$ 8.000,00 para
compra sem licitação. As licitações começaram a aparecer a partir do terceiro
mês, com valores altos, sempre com a motivação de “aquisição de gêneros
alimentícios para atender as necessidades da Câmara”.
Se as necessidades da Câmara são tão grandes assim
para se arvorar no dinheiro público com alimentação, então não se pode deixar
de mencionar que os gastos com alimentação no primeiro ano chegam a R$ 280 mil.
A Cavalcante & Aquino Ltda tem um vasto leque de
serviços prestados à Câmara de Parauapebas, que vão desde alimentos, passando
por impressão de cópias de documentos, material de expediente e processamento
de dados.
Mas a fome dos servidores da Câmara de Parauapebas
parece que não tem fim. Embora não haja informações no Portal da Transparência
em relação ao exercício de 2014, pudemos encontrar no site do Diário Oficial do
Estado várias licitações publicadas pela CMP, algumas delas exclusivamente para
o fornecimento de “gêneros alimentícios”.
Em um deles, com vigência entre 9 de abril e 31 de
dezembro de 2014, a Câmara publicou dois extratos de contrato com a empresa D.Ferreira
Melo Cavalcante no valor de R$ 348.218,40 para “aquisição de gêneros
alimentícios estocáveis e não estocáveis para atender a Câmara Municipal de
Parauapebas”. Todas as licitações são assinadas pelo presidente da Câmara,
Josineto Feitosa de Oliveira, na qualidade de ordenador de despesas.
Outro extrato de contrato encontrado no Diário
Oficial foi formalizado com a empresa J.Reis Vieira no valor de R$ 101.699,80,
também com vigência entre 9 de abril e 31 de dezembro de 2014. Por ele, a
Câmara se compromete em pagar por “aquisição de gêneros alimentícios estocáveis
e não estocáveis para atender a Câmara Municipal de Parauapebas”.
Foi um desses contratos que resultou em um documento
assinado por alguns moradores de Parauapebas que foram parar no Ministério
Público. Ele não contém indícios de irregularidades, mas apontam para caminhos
que podem estar recheados de superfaturamento, como é o caso de compras com a
empresa D.Ferreira Melo Cavalcante, popularmente conhecida em Parauapebas como
Supermercado Baratão.
Também precisam ser esclarecidos os contratos para aquisição
de tantos materiais de expediente para atender às necessidades da Câmara. Os
contratos publicados no Diário Oficial e as notas pagas deveriam ser analisadas
com cuidado pelas autoridades fiscalizadoras.
Josineto
faz aditivos 5 vezes maiores que o valor da licitação
O presidente da Câmara de Parauapebas, Josineto
Feitosa, precisa explicar por que fez aditivos de contratos com empresas de
Parauapebas com valores cinco vezes maiores que o que constava na licitação
ganha por elas.
Por exemplo, o extrato resumido do aditivo ao
Contrato nº 20130010 informa que a contratada V.C.dos Santos – Restaurante ME –
deve oferecer serviços de fornecimento de buffet, coquetel e café da manhã para
atender à Câmara Municipal, e “o presente termo aditivo objetiva a alteração
contratual no valor de R$ 54.485,45, passando o contrato a ter valor total de
R$ 272.427,25.
Em outro extrato aditivo ao Contrato nº 20130030 de
licitação, a empresa Gráfica Bahia Ltda ganhou licitação no valor de R$
19.976,90, mas conquistou graciosamente um aditivo, amplificando o contrato
para o valor de R$ 99.884,50.
Em outro contrato, nº 20130015, a empresa J.Reis
Vieira também foi beneficiada com um aditivo para aquisição de gêneros
alimentícios. O contrato inicial era para R$ 39.933,48 e ganhou um fermento
para R$ 199.876,48.
O contrato nº 20130031 com a empresa Sacramento
& Cia Ltda para contratação de serviços gráficos tinha valor de R$
18.012,75 e foi catapultado para R$ 90.063,75, mais de cinco vezes o valor
inicial.
O mesmo ocorreu com a empresa J.L.P.Santos & Cia
Ltda para fornecer serviços de reservas e fornecimento de passagens aéreas para
atender às necessidade do Poder Legislativo de Parauapebas. O contrato inicial
era de R$ 47.850,00 e surgiu na internet posteriormente com o valor de R$
239.250,00 através de um voo supersônico.
Mas há um caso intrigante de contratação de uma
empresa para com inexigibilidade de licitação. Trata-se do Instituto de Direito
Público do Pará, contratado a peso de ouro: R$ 130.000,00 para ministrar “curso
sobre patrimônio público” para os servidores da Câmara Municipal.
Os especialistas consultados pelo jornal dizem
desconhecer a instituição. “É preciso saber se ele tem notória especialização e
o serviço que prestou é singular, isto é, se outras entidades semelhantes não
poderiam efetuar o mesmo serviço. Logo, devendo haver licitação para contratar
esta entidade; pelo que vi, é uma entidade desconhecida, jamais tinha ouvido
falar; é preciso pesquisar onde fica, quem são os proprietários e se o curso
era mesmo necessário e se foi realizado”.
Segundo o mesmo especialista, chama a atenção os
seguintes pontos que devem ser melhor verificados:
1. A data das alterações dos contratos parecem ser
as mesmas; o fundamento jurídico é o mesmo para todos os aditivos; eles
ultrapassam o valor de 25% estipulado para esse tipo de prorrogação contratual,
para serviços ou compras, conforme o parágrafo 1º do artigo 65 da Lei nº 8.666/93,
citado nos extratos; o fundamento legal previsto no inciso I, letra
"b", do referido artigo, que admite a prorrogação contratual somente
quando tem como necessária a alteração contratual "em decorrência de
acréscimos ou diminuição quantitativa de seu objeto", ou seja: aumentou-se
a aquisição de passagens, refeições, serviços de gráficas e outros, assim de
uma vez só, numa mesma época?; “Seria necessário ter acesso aos autos e a
motivação integral, já que essa variação do preço deve estar relacionada com o
aumento do objeto; mesmo assim, com o limite de até 25% do valor inicial do
contrato; qual a razão para estes aumentos: alteração do preço de custo dos
serviços? Todos de uma só vez? Realmente ultrapassaram em muito o valor do
percentual de 25% para serviços, o que deixa a necessidade de ser investigados
estes aditivos.
Por último, o especialista diz que caso essa
situação seja irregular, pode proporcionar enriquecimento ilícito ou mesmo
frustração do processo licitatório que pode levar para repercussão na esfera
penal, artigo 92 da Lei nº 8.666/93, para o responsável. Logo, se para aditivar
os contratos até os 25% já há que ter causa justificada, então acima desse
percentual surgem indícios de improbidade administrativa; e o cálculo do
percentual tem que ser em cima do valor original do contrato prorrogado.
Denúncias
apontam para caixa dois
Matéria veiculada em blogs e sites de
Parauapebas no início do mês de junho.
Os vereadores Odilon Rocha (SDD) e Irmã Luzinete
(PV), de Parauapebas, estão sendo acusados de pressionar o comerciante Edmar, o
popular “Boi de Ouro”, proprietário do Supermercado Baratão, a pagar propina
por meio de nota superfaturada da Câmara Municipal.
De acordo com a denúncia, os parlamentares teriam
chegado no início da noite de quinta-feira (5 de junho) ao escritório do
Supermercado Baratão, na Rua A, esquina com a Rua 4, e Luzinete passou a
ameaçar o proprietário do estabelecimento, que estava no andar de cima, dizendo
para um funcionário que o comerciante não era homem, enquanto Odilon pedia para
ela se acalmar.
Segundo informou a testemunha à reportagem, o
supermercado fornece alimento para a Câmara Municipal e tinha uns veículos
locados para aquela repartição pública. As caminhonetes eram locadas por mais
de R$ 1 milhão.
A testemunha afirma que a vereadora chegou pedindo
dinheiro a mais da nota que a Câmara paga para o supermercado. No momento, o
proprietário do estabelecimento se encontrava no andar superior do prédio, onde
reside.
A fonte do supermercado acrescentou que durante o
contrato de locação dos veículos a presidência da Câmara exigia importância a
mais do contrato, o tal caixa dois. O contrato de locação dos veículos foi
encerrado dia 6 deste de junho, mas o fornecimento de alimento continua.
O funcionário do supermercado disse estranhar por
que a presidência da Casa passou o caso da comissão para os vereadores Luzinete
e Odilon tratar com Edmar.
Outro
lado
Procurada pela reportagem na manhã do dia 9 de
junho, a vereadora Irmã Luzinete, a princípio, negou que tivesse visitado o
estabelecimento comercial. “Não estive lá e nem conheço esse empresário. Não
participo de nenhum esquema de corrupção da Câmara. Eu represento Deus aqui na
terra”, sustentou.
Com a insistência do repórter, dizendo que
testemunha tinha visto ela no supermercado, na companhia do vereador Odilon, a
vereadora confessou que esteve lá, sim, para fazer companhia ao colega de
parlamento, que, segundo Luzinete, empresta dinheiro a juros para o dono do
supermercado e ele foi lá receber parcelas atrasadas, “mas nada a ver com a
Câmara”.
Ouvido também pela reportagem, o vereador Odilon
Rocha contou uma versão diferente, dizendo que chegou ao escritório do
supermercado e encontrou a vereadora Luzinete muito aborrecida, mostrando-se
bastante exaltada, querendo falar com o dono do supermercado. “Pedi pra ela se
acalmar, afirmando que aquilo não era um bom procedimento, mas não tomei
conhecimento do assunto que a colega queria tratar com o comerciante”, revelou
Odilon Rocha, acrescentando que em seguida deixou o local e a vereadora teria
ficado lá.
Sobre o assunto, o vereador Josineto Feitosa (SDD),
presidente da Câmara Municipal, confirmou que o Poder Legislativo tinha dois
vínculos de prestação de serviços com a empresa de Edmar Boi de Ouro, sendo um
de locação de veículos, que encerrou em 6 de junho, e o outro referente
fornecimento de gêneros alimentícios. Este último, no valor de mais de R$ 200
mil por ano.
“Desconheço os motivos que levaram os vereadores
Odilon e Luzinete a ir tratar deste assunto naquele supermercado. Desconheço
também qualquer tipo de superfaturamento de nota. Vou entrar em contato com o
empresário para eu tomar ciência do que está ocorrendo e depois chamar os
vereadores que teriam ido lá”, informou Josineto Feitosa.
Procurado para falar sobre o assunto, o empresário
Edmar Boi de Ouro não confirmou e nem desmentiu as acusações, preferindo não
tecer nenhum comentário sobre o tema.
MP
instaura procedimento investigatório
O promotor Paulo Sérgio da Cunha Morgado Júnior, de
Parauapebas, explica que no dia 17 de julho recebeu uma representação no
Ministério Público por alguns populares. E levou um teor um pouco vago sobre a
suposta fraude no fornecimento de gêneros alimentícios na Câmara dos
Vereadores, assim como na locação de veículos da Câmara. Diante disso, uma
cópia ficou com a 4ª Promotoria de Justiça, para apurar a responsabilidade
civil e a improbidade administrativa, e uma via foi para a 1ª Promotoria
Criminal, a qual ele responde.
Nesta última, ele instaurou um (Procedimento
Investigatório Criminal) similar ao inquérito policial, que dá os primeiros
passos para uma investigação. “A representação está vaga, então, é necessário
colhermos elementos, instruir os procedimentos para verificar se ocorreu, ou
não, fraude, superfaturamento de notas, assim como desvio de dinheiro público”.
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