terça-feira, 21 de abril de 2009

Um capitão de nome

CRÔNICAS DO PC

São muitas as histórias que contam a respeito do brioso capitão Câncio, no tempo da ditadura militar, em que ele comandou uma companhia de polícia numa cidade muito importante do interior do Piauí, chamada São Raimundo Nonato, a Capital da Pré-história, assim conhecida, dado a descoberta de mais de oitocentos sítios arqueológicos, onde os estudiosos encontraram importantes provas da existência de uma civilização que ali viveu há milhares de anos passados, deixando nas cavernas o marco maior de sua passagem, que são as escritas rupestres.

Nas escavações realizadas, foram encontradas urnas funerárias e objetos de cerâmicas, além de um esqueleto humano de mulher, segundo datação através do processo do carbono 14, com idade de mais de 12 mil anos. A cidade é um museu a céu aberto, interessante de se visitar.

Capitão Câncio, oficial da Polícia Militar do Piauí, chegou à cidade nos meados dos anos 60.

Naquele tempo, em todo o Brasil, nossas cidades viviam um clima muito tenso. Estavam em vigor os atos institucionais, cerceando a liberdade constitucional do povo. Os militares deitavam e rolavam no regime de força, controlavam tudo, encabrestando os políticos que exerciam o poder político. Muitas prefeituras, consideradas áreas de segurança nacional, ficaram sob intervenção federal. Mesmo assim, não deixavam de haver as querelas partidárias, muitas das vezes, os grupos rivais chegando às vias de fatos.

Foi numa situação igual a essa que o capitão Câncio fora escolhido para pôr termo na situação de violência na cidade de São Raimundo Nonato.

A primeira providência que tomou foi colocar ordem na própria casa. Rigidamente, disciplinou seus comandados dentro dos critérios militares. Pretendia dar um bom exemplo de ordem e comportamento, começando pelos seus subordinados. Em seguida, comunicou à população não admitir nem desordem nem provocações. Quem não obedecesse seria conduzido preso, sendo trancafiado na cadeia pública.

Militar sério, rígido, sempre executando suas tarefas sem nunca sair da linha, não tardou, por disciplina e por imposição de força, em consertar o que considerava errado, sem distinção, na cidade.

Ganhou a simpatia da população, seu nome ficando conhecido e temido em toda a região. Ninguém queria cair nas garras do capitão Câncio. A polícia tornou-se uma instituição respeitada, fazendo cumprir as leis e determinações militares, doesse em quem doesse.

Em 1967, aconteceram as eleições municipais. Foi determinado que haveria pleito em todas as cidades brasileiras, exceção para as consideradas de Área de Segurança Nacional. Às vésperas do pleito, os chefes políticos encontravam-se organizados para a disputa dos cargos eletivos. Na casa de um deles, o movimento ultrapassava as expectativas. Muita gente apoiando seus candidatos.

Para ser mais gentil, obrigava-se a fornecer alimentação a quem aparecesse prometendo votos. Para tanto, estava preparado. No cercado bem perto da casa, vários animais, entre carneiros, porcos, bois e até um touro de mais de vinte arroubas, que se encontrava amarrado em um mourão, brabo, berrando, fungando, tirando fumaça pelas ventas, sendo alvo das atenções dos presentes.

Em dado momento, o animal deu um pulo e conseguiu arrebentar a corda que o segurava. Rompeu a cerca, ficando livre. Baixou a cabeça e correu em direção a um grupo de pessoas, disposto a remeter. Foi gente espalhada para todos os lugares, ficando em cima de árvores e muros. O touro ficou parado debaixo de uma frondosa mangueira, ciscando, jogando terra para trás. Não teve homem corajoso que se atrevesse a chegar perto do bicho, nem mesmo para abatê-lo a tiros, porque só servia utilizar arma de grosso calibre.

O chefe político lembrou-se do capitão Câncio, comunicando-lhe o problema. Não demorou nada e o militar apareceu conduzindo no ombro um fuzil. Procurou um ponto apropriado que desse posição de tiro, e apontou a arma, mirando a testa do animal. Apertou o dedo no gatilho e disparou. Para sua surpresa, errou o alvo. A bala passou apenas de raspão, abrindo um corte na testa do touro. O animal espantando, ferido, ficou mais furioso, correndo em direção ao militar, pronto para atacá-lo. O capitão deu um pulo de lado, manobrou o fuzil novamente e atirou rápido, desta feita sem fazer pontaria. O animal deu um cangapé e caiu esperneando, mostrando um buraco de bala bem no meio da testa. O capitão sacou de uma lambedeira da cintura e sangrou o animal, bem sangrado, seccionando a veia jugular e o cabelouro do bicho.

O público que assistiu a cena vibrou. Pegaram o capitão e saíram com ele pelos braços.

Depois desse feito, o homem virou herói, sendo cantado em prosa e versos em toda a região.

Pedro Cláudio M.Reis (PC) / E-mail: pcmourareis@yahoo.com.br

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